Monday, July 16, 2007

O conforto de acreditar na esquerda

Este artigo foi escrito por mim há cerca de 6 anos, mas talvês devido á vitória do Partido Socialista em Lisboa, este artigo possa ser novamente lido.

A base para este artigo parte de uma ideia, que julgo, ter cada vez mais consolidada. Um dos últimos e mais expressivos impulsos, para que a minha crença em acreditar que é confortável assumir posições de esquerda, e dar apoio a espaços ideológicos e partidários de esquerda, ou até extrema esquerda, foi o acto eleitoral de 16 de Dezembro de 2001, em que o Partido Comunista Português, em coligação com outra estrutura partidária de esquerda, o Partido Os Verdes, obteve o número de votos necessários para assumir a liderança do executivo municipal em Setúbal.

Partindo deste cenário político concelhio, passo então a explicar as razões pelas quais eu acredito que é confortável (eventualmente para muitas pessoas no nosso concelho) acreditar nos partidos de esquerda. Convêm antes demais avisar as pessoas, que tiveram a apetência para lerem até este ponto esta minha humilde e sincera opinião, sobre alguns dois esclarecimentos prévios. Em primeiro lugar informo os leitores que este artigo não é uma manifestação de apoio aos partidos de esquerda nem às suas posições políticas e ideológicas. Em segundo lugar, as próximas ideias baseiam-se mais no meu conhecimento comum, na minhas experiência e atitudes pessoais, do que numa concepção cientifica previamente estruturada. São duas as ideias nas quais eu irei fundamentar as minhas razões. A primeira refere-se à enorme capacidade de dádiva que os partidos de esquerda tem e que geram comportamentos colectivos de distanciamento perante os problemas e
os factores, em lato senso, sociais. A segunda ideia aborda um instrumento útil para qualquer político, que é a capacidade de persuasão.

Explicando melhor a questão da dádiva, segundo o antropólogo francês Marcel Mousse(1), a dádiva cria dividas, apesar de socialmente ter uma forma gratuita. Qualquer dádiva é revestida de interesses que assumem várias formas: aumento da nossa auto-estima, obtenção de reconhecimento, criação e desenvolvimento de laços sociais, conquista de mais-valias económicas a médio e longo prazo, ganho de votos pelas populações com vista a alcance de lugares de decisão política e pública. Mousse observou processos de dádiva em sociedades arcaicas como na Polinésia, e pôde constatar que a dádiva é um dos mecanismos de legitimação do poder.

São as dádivas, as ofertas sociais e económicas que a Esquerda faz, nomeadamente em Portugal, que provocam uma forma de estar social passiva (ou pacifica, como alguns actualmente agora gostam de incluir no seu cardápio moral e ideológico). As pessoas gostam de atingir uma certo grau de bem-estar, de prosperidade e de qualidade de vida, a que justamente tem direito. A Esquerda, promove estes objectivos, e fá-lo através da distribuição de poder, da distribuição de responsabilidades, da inclusão das populações nesse poder de decidir e de participar; no entanto a maneira excessivamente democrática como o faz, provoca a descaracterização do poder, o que leva em situações mais criticas à desgovernação. E uma consequência que eu julgo ser negativa, é a falsa participação das populações em processos de decisão públicos, nos quais elas julgam ter um poder efectivo. As lideranças de esquerda mostram normalmente duas faces: ou totalitária/centralizadas (os casos de Cuba, da Coreia do Norte e da ex-URSS) ou fracas/difusas (os casos do PCP de Carlos Carvalhas e do PS de António Guterres). Um caso extremo de dádiva ocorrida em Portugal no pós-25 de Abril, e que os mais velhos certamente se recordaram, foi com o período de governo de Vasco Gonçalves, que, apoiado pelos partidos de esquerda e de extrema-esquerda, iam provocando a ruína da nossa economia e da nossa sociedade, nomeadamente tendo uma política redistributiva muito forte e pesada para os recursos existentes.

A segunda ideia que referi anteriormente, a capacidade de persuasão, provoca os mesmos efeitos que a questão da dádiva. O discurso político dos partidos de esquerda, é, na sua origem, um discurso tipicamente poético, embebido de sofrimento e de sonho, inventado cenários ora paradisíacos ora infernais. Recentemente, num debate sobre "Juventude e Globalização" ocorrido em Setúbal, um político do PCP falava de uma sociedade de explorados e de exploradores...a "eterna" luta de classes segundo Marx. Provavelmente esse senhor não se lembrou da forte classe média que existe no nosso país. Portugal é um país de românticos, em que os discursos dos partidos e dos políticos de esquerda ainda encantam muitas vezes. Quem não se lembra da famosa "paixão" pela educação do Eng.º António Guterres? Este slogan encantou durante algum tempo professores, pais e alunos. Também podemos falar em demonstrações algo inovadoras do Bloco de Esquerda, que com dotes de magia teatral, consegue cativar alguns jovens das grandes áreas urbanas. Os portugueses sentem-se confortáveis ao ouvirem um discurso que os acalme, que os tranquilize, que os faça pensar que está tudo bem, e que não é necessários estarem preocupados. Um dos melhores exemplos de discurso tranquilizante foi nos dado pelo governo socialista liderado pelo conciliador Engº António Guterres.

Apesar da forma irónica com que exprimi as minhas opiniões sobre o que, de forma sintética, penso sobre a Esquerda no nosso país, tentei agir de maneira sincera. Estamos a poucos dias de ter celebrado mais um 25 de Abril (que a Esquerda faz sempre questão em dominar as mudanças e as liberdades que foram alcançados com esta revolução), mas também estamos a poucos dias da aprovação de algumas leis que seguramente vão alterar, para melhor ou para pior, os nossos quotidianos, espero que estejamos a poucos dias...de mostrar que a inércia, o falso silencio, os extremismo ideológicos, as posições partidárias em detrimento das posições cívicas e realistas; tenham cada vez menos peso e influência na sociedade portuguesa. Nós somos um povo que já se mostrou capaz, ao longo dos séculos, de transformar as palavras em actos e os actos em palavras, ou seja dizer uma coisa e fazer essa coisa, e assumir o que fizemos dizendo que o fizemos. Desculpem-me estas meias-frases, que vos indicam que nós somos um povo empreendedor!




Notas:
(1) Mousse, Marcel - "O Ensaio sobre a dádiva" Lisboa, Edições 70, 1988

1 comment:

Anonymous said...

Oi

Se você tem interesse por Cuba, talvez se interesse por um livro que escrevi. Nada de pesado, acadêmico ou político, só histórias leves de coisas que eu vi e pessoas que conheci nessa terra tão interessante.

No blog que criei para o livro, tem algumas crônicas completas, trechinhos de todas e muitas fotos legais:

http://radicalrebelderevolucionario.blogspot.com

Abração,
Alex